Tesifon Sanches Garcia
Relatos orais de Thereza Sanches
Redação e pesquisa de Carlos Ferreira Júnior, de Isabel Burin Ferreira e de Camila Ferreira. Respectivamente, filho, nora e neta de Thereza Sanches, filha de Tesifon. (Ao lado, foto do passaporte de Tesifon).
O ano era 1917, momento em que a Espanha se encontrava em um grande conflito interno, pois mesmo que se mantivera neutra na 1ª guerra mundial, ainda assim, se recuperava das consequências resultantes da guerra Hispano- americana.
Precisamente, estamos nos referimos a cidade de Ugíjar, localizada na província de Granada, uma comunidade autônoma de Andaluzia, bem no pé da Reserva Nacional de Serra Nevada. Cidade natal de um grande homem, um ex-seminarista, que além de seu honroso caráter, carregava consigo importantes valores, principalmente um olhar ímpar em relação ao próximo.
Oprimido por fortes perseguições que combatiam a “consciência de classe”, historicamente conhecida pela “Semana Trágica” (*fatos que assolavam a região de toda Catalunha), parte rumo ao Brasil, na cidade de Serra Azul SP, este grande homem.
Em sua bagagem, carregava consigo sua família (*esposa grávida e seus dois filhos), além da esperança de uma nova vida, onde pudesse vivenciar e desfrutar livremente de suas convicções e de seus fortes ideais socialistas.
Permaneceu em Serra Azul por pouco tempo, logo mudou-se para charmosa cidade vizinha, São Simão, e lá permaneceu até os seus últimos dias de vida.
Foram exatamente 75 anos de uma linda história construída e que passa a ser contada e relembrada saudosamente nesta crônica, por Thereza Sanches, filha de seu segundo matrimônio com Francisca Scavone, após o falecimento de sua primeira mulher Teresa Rincon.
Tesifon, com seu caráter ímpar e de fortes ideais políticos, deixa marcas incontestáveis, indeléveis de sua luta pela igualdade e equanimidade entres os homens. Não havia nada e nem ninguém que o desviasse de seu propósito, cumpria fielmente os seus ideais.
Certa vez, em um comício político, ocorrido hoje na tão movimentada Praça da República, um dos candidatos simpatizantes de Tesifon, foi impedido de subir ao coreto. Seus opositores retiraram a escada que dava acesso ao coreto, em uma tentativa de sabotar a explanação de seu candidato.
Sem pestanejar, Tesifon, juntamente com alguns correligionários, fizeram uma escada humana, para que seus oradores pudessem se manifestar.
Outro fato curioso sobre esta personalidade, foi o apelido dado a Tesifon de Timošenko, nome pertencente a um general do exército Russo. Tesifon era a favor da Rússia durante o período da 2ª guerra mundial, que fazia parte por sua vez dos “Aliados” contra o “Eixo”. Como já diziam alguns revisionistas, ganhou a guerra.
Discursando ainda sobre suas características pessoais, Tesifon valorizava muito a sua família e amigos. Apesar de ser um homem discreto e reservado, compartilhava com os seus filhos, suas vivências do cotidiano, assim como sua esposa também o fazia.
Dentre os seus amigos, tiveram alguns que exerceram liderança de partido de esquerda progressista, como Dácio Aranha de Arruda Campos, o qual foi juiz em São Simão e posteriormente redator do jornal Estadão, assinando seus artigos com o pseudônimo de “Matias Arrudão”.
Tesifon foi zelador do antigo Clube Operário. Dentro do salão deste clube, administrava o seu bar. Com o passar do tempo, ele inaugurou um outro bar chamado de “Nosso Bar”, localizado na esquina das ruas Deodoro da Fonseca com a Rui Barbosa e era de lá a principal fonte de sustento de sua família.
Posteriormente uniu-se ao seu genro Carlito Ferreira para abertura de um novo bar. Este chamava-se “Para Todos”. Localizado na esquina das ruas Deodoro da Fonseca com a Vinte de Agosto, era o “point “do famoso lanche, o “Bauru do Carlito”.
Mas a história não para por aqui. Sua cabeça pensante não sossegava por um só instante.
Tesifon teve um papel importante na contribuição do desenvolvimento social simonense.
Foi o realizador da grande “Festa da Raça”, evento que acontecia anualmente no dia 12 de outubro, na Sociedade Italiana, onde fica hoje a atual biblioteca da cidade. Este fato foi relatado pelo jornal da época, “Correio Paulistano” (*publicação feita em 16/10/1935).
Movido pela sua inquietude em realizar algo maior, mais significativo ao povo simonense, usufruiu do seu profundo conhecimento sobre a história do Grêmio São Simonense, para reativá-lo com facilidade.
Foi lá que, por volta de 1935, ele juntamente com um grupo de amigos, arrumaram o prédio que ficava na Rua Expedicionários para ser a sede oficial do Grêmio.
Formaram uma diretoria que, por fazerem parte diretores afrodescendentes, algumas pessoas de má formação moral, tacharam esse Grêmio de “Clube dos Pretos”, fato este que não impediu o seu sucesso.
Algumas regras foram estipuladas para a participação do Grêmio. Dentre elas, a proibição da entrada de pessoas portando chapéus e chinelos, além da necessidade de se tornar um membro sócio do clube.
Era lá que aconteciam os bailes da cidade e os encontros entre amigos.
Além dos acontecimentos supracitados, Tesifon foi um dos responsáveis na fundação de duas bandas musicais em São Simão. Juntamente com outras personalidades da cidade, trouxe o maestro e músico Prachedes. Este, por sua vez, formou muitos músicos que ficaram conhecidos naquela época. Vários outros fatos poderiam ser relatados aqui, mas o pouco que expusemos, deixa evidente a existência de um grande e importante personagem real da
sociedade simonense.
Seu legado reforça a importância de lutarmos incansavelmente por uma sociedade mais justa, mais colaborativa e principalmente inclusiva, independente dos obstáculos que iremos nos deparar, pois estes existirão em todo o processo de evolução.
Se o estimado Tesifon pudesse dar um conselho a todos vocês que estão lendo esta singela homenagem, certamente teria dito:
“Meus caros, sejam justos, sejam pacientes, sejam resilientes. Tornem-se cidadãos decentes, sejam exemplos aos seus! Pois é na dificuldade que a gente aprende a viver e é na igualdade que se aprender a Ser!”
"Acreditem, simplesmente acreditem!”
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